“Palavras, isso não é amor. O amor é concreto todos os dias”, diz Papa
07/05/2018Papa: escravidão não é algo de outros tempos
07/05/2018Vivemos o tempo em que as pessoas elegem livremente e por convicções suas opções. Sabemos, é claro, que há condicionamentos culturais e pressões que o modo majoritário de ver o mundo exerce sobre todos. A vivência da religião e da opção de fé também passam por esta destradicionalização. Isto é, as pessoas não vivem sua fé unicamente porque seus pais e avós lhes transmitiram. Isto pode ser positivo, no sentido de exigir maior profundidade e autenticidade, mas pode, também, ser ocasião para muita confusão.
Não é novidade que o catolicismo brasileiro se formou no encontro de várias matrizes culturais: indígena, africana e europeia. Soma-se, num tempo mais recente, a proliferação de tantos caminhos que são oferecidos no mercado espiritual, alguns cristãos, outros não. Quando ainda era predominante o catolicismo tradicional, de cunho cultural, tínhamos uma vivência da fé que era manifestada por meio de ritos, promessas e devoções. Mas a religião não é a única a sofrer o impacto, visto que outras instituições também passam por crises, como a família, o Estado, a escola e outras. Isto produz a fragmentação da pessoa e da sociedade e a consequente perda da unidade interior e hierarquia de valores. Não é difícil encontrar quem, sem peso de consciência, frequenta as celebrações católicas, mas participa também em encontros de outras religiões e até doutrinas que se opõem, em seus princípios, à fé cristã. Talvez, porque o critério de coerência e da verdade esteja sendo colocado em segundo lugar em relação ao sentimento de acolhida, pertença e bem-estar.A facilidade de acesso às informações também foi um elemento importante para muitos acolherem elementos, até contrastantes, em sua visão de mundo e de fé. Como resultado, temos um relativismo que traz muita confusão nas consciências.
Algo parecido pode acontecer também ao interno da própria fé católica. O Papa Bento XVI chamou a atenção, em Aparecida, em 2007, para “uma fé católica reduzida a uma bagagem, a um elenco de algumas normas e de proibições, a práticas de devoção fragmentadas, a adesões seletivas e parciais das verdades da fé…” (Discurso inaugural, n. 12). De fato, a fé católica constitui um edifício harmônico, no qual não é possível fazer opções por algumas verdades e rejeitar outras sem cair em contradição. Jesus Cristo e o seu Evangelho é o centro nucleador que oferece um sentido unificador para a existência, muitas vezes, fragmentada. Não somente a adesão intelectual às verdades por Ele anunciadas, mas a comunhão de vida, com o Senhor Ressuscitado, que veio até nós como nosso Redentor e caminha conosco. Então, a adesão à fé católica, na comunhão eclesial, não pode ser seletiva, mas integral, na busca contínua das razões pelas quais se crê. Daí também a coerência das opções pastorais e da moral. Seria uma contradição gritante seguir a Jesus Cristo e não ter um coração misericordioso, sobretudo com os pobres. Seria uma mera filosofia de vida se um cristão não tivesse diariamente o encontro com o Senhor na oração. Não podemos reduzir a fé à sua dimensão fraterna intra-histórica, pois a Igreja seria somente uma boa instituição de caridade. Do mesmo modo, o cristão coerente sabe dar o devido valor à liturgia, às celebrações, às pastorais sociais e à iniciação à vida cristã. Elas formam um todo, de maneira coerente.
Vale o convite do Papa Bento XVI: sempre partir de Cristo e do seu Evangelho, “que dá um novo horizonte à vida e, com isso, uma orientação decisiva” (Deus Caritas Est, n.1). Encontrá-lo, segui-lo e amá-lo é a base para viver de maneira coerente a vida cristã.
Por Dom Adelar Baruffi – Bispo de Cruz Alta (RS)