Audiência: alimento não é propriedade privada. O apelo do Papa pelas crianças famintas
27/03/2019ENCONTRO DA CEP PAROQUIAL
27/03/2019
“Estai sempre prontos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que a pedir.” É compreensível essa recomendação do apóstolo Pedro: os cristãos, que viviam em pequenas comunidades, eram uma minoria no meio da imensa população pagã. O apóstolo sabia que se os discípulos de Jesus de Nazaré fossem fieis à sua fé atrairiam outros pelo seu testemunho. Tanto isso aconteceu que Tertuliano, um escritor do terceiro século, guardou a observação feita pelos pagãos a respeito dos cristãos: “Vede como eles se amam!”
O cristianismo aprendeu e ensinou, desde cedo, a necessidade de se conviver com o diferente. Conviver, no caso, significava respeitar quem tinha uma outra expressão religiosa ou, mesmo, quem não tinha religião alguma. Afinal, cada pessoa tem direito à liberdade religiosa. Ninguém pode ser coagido a praticar uma fé. Jesus Cristo respeitou a liberdade dos ouvintes crerem ou não em seus ensinamentos. Por isso, depois de apresentar suas propostas, dizia: “Se alguém quiser vir após mim…”. Cada ser humano tem direito de ser respeitado no campo religioso. Ninguém pode ser coagido a crer. Isso foi reconhecido, inclusive, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948 (cf. Artigo 2°). Nossa Constituição é clara nesse ponto: “Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa” (Art. 5º – VIII). Cabe ao poder civil proteger e promover todos os direitos humanos, velando para que não haja discriminação religiosa entre os cidadãos.
À luz desses princípios, fica difícil entender como, em pleno século XXI, ainda possam ocorrer manifestações de ódio e violência por motivos religiosos. Algumas pessoas ou grupos julgam que ninguém tem o direito de pensar, no campo religioso, de forma diferente da sua. Julgam também que, se alguém tiver a ousadia de pensar diferente, deve ser considerado um inimigo e, como tal, merece ser destruído.
Nasci e cresci num ambiente em que o direito à liberdade religiosa era normal. Ao se casar, meu pai era de uma religião diferente da de minha mãe. Cada um praticava a sua com toda a liberdade. Anos depois é que, por opção livre e inesperada, ele quis assumir a fé católica. Foi o testemunho e a coerência dela que o levaram a isso.
A boa convivência entre pessoas que têm religiões diferentes não significa indiferentismo ou que as divergências entre as religiões sejam secundárias. Não são. Nós cristãos, por exemplo, temos no centro de nossa fé a pessoa de Jesus Cristo, Filho de Deus e Salvador. Podemos, como orientava o apóstolo Pedro, apresentar aos que nos pedirem as razões de nossa esperança. O que não podemos, e ninguém pode, é, por motivos religiosos, transformar a convivência na sociedade em um campo de batalha.
Por Dom Murilo S.R. Krieger – Arcebispo de Salvador, via CNBB