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Fratelli Tutti desmistifica o romantismo da fraternidade e alerta: “Salvamos todos ou não se salva ninguém”. “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida”. A frase do poeta brasileiro Vinícius de Moraes, uma referência ao Samba da Bênção, foi citada na Encíclica Fratelli Tutti [Todos Irmãos] do Papa Francisco, assinada em 3 de outubro de 2020 e publicada em 4 de outubro, dia de São Francisco de Assis. O título é uma citação direta das “Exortações” do Pobrezinho de Assis.
O trecho da canção de Vinicius de Moraes para o samba de Baden Powell, que foi lançado no álbum do poeta de 1967, é uma reflexão que pessoalmente me acompanha há anos. Recentemente, numa mesma semana, graças à internet, “reencontrei” Ivo e Rodrigo, dois amigos que há anos não tinha notícia. Nos conhecemos muito jovens, em Roma, cerca de 15 anos atrás. Cada um seguiu um rumo. Semana passada, retomei a conexão com eles, um na França e outro na Alemanha. Coincidentemente, estamos todos casados e cada um foi presenteado com um casal de filhos. Num mundo de tanto desencontro, a arte do encontro nos conecta surpreendendo com a bênção da amizade que não conhece tempo nem fronteiras.
A conexão entre a fraternidade e o encontro
Porém, Fratelli Tutti quer desmistificar aquela ideia romântica da fraternidade e despertar para a conexão que existe entre os seres humanos. Publicada neste ano tão desafiador para a humanidade, o documento é um convite ao crescimento da “consciência de que, hoje, ou nos salvamos todos ou não se salva ninguém”. Essa “certeza é maior do que nunca devido à realidade dum mundo tão interconectado pela globalização”, diz o Papa.
“Apesar de estarmos superconectados, verificou-se uma fragmentação que tornou mais difícil resolver os problemas que nos afetam a todos. Se alguém pensa que se tratava apenas de fazer funcionar melhor o que já fazíamos, ou que a única lição a tirar é que devemos melhorar os sistemas e regras já existentes, está a negar a realidade”, afirma a Carta.
Abramos às surpresas de Deus
Encíclica é uma palavra que do latim medieval tem a mesma raiz da palavra enciclopédia adaptada do grego, que é uma comunicação escrita papal dirigida a toda a Igreja, alargando-se a todas as pessoas de boa vontade. A Carta de Francisco sobre amizade e fraternidade universal recorda-nos dos irmãos, como o beato católico Carlos de Foucauld e irmãos não católicos como Martin Luther King, Desmond Tutu, Mahatma Mohandas Gandhi. “De todos se pode aprender alguma coisa, ninguém é inútil, ninguém é supérfluo”, garante Francisco.
“O ponto de partida deve ser o olhar de Deus. Porque, ‘Deus não olha com os olhos, Deus olha com o coração. E o amor de Deus é o mesmo para cada pessoa, seja qual for a religião. E se é um ateu, é o mesmo amor. Quando chegar o último dia e houver a luz suficiente na terra para poder ver as coisas como são, não faltarão surpresas!’, explica Francisco. Irmãos Todos, nos abramos às surpresas de Deus e ao Deus das surpresas.
Por Rodrigo Luiz dos Santos, via Canção Nova