A santidade é uma vocação para todos, assegura o Papa Francisco
21/05/2018Papa: a Igreja é mulher e mãe, como Maria
21/05/2018O cenário desafiador do desemprego aflige milhões de famílias, atrasa o desenvolvimento nacional e causa graves prejuízos. Para superar essa situação, passo importante é compreender que os conceitos de trabalho e trabalhador vão muito além de indicadores econômicos. É preciso considerar o trabalho de cada cidadão, em articulação com iniciativas nas famílias, comunidades e na sociedade, para que o país conquiste novos rumos e seja alcançado um novo patamar sociocultural, com repercussões positivas na economia. Em meio à crise que atinge frontalmente os trabalhadores, convém resgatar, para além de teorizações, o sentido inegociável do trabalho humano – atividade que remete à reconstrução e à qualificação da sociedade.
Gerar empregos é urgência reconhecidamente inegável, principalmente quando se tem visão global sobre a importância do trabalho. A Doutrina Social da Igreja Católica, incontestável referência na defesa e promoção da dignidade humana, oferece muitas contribuições nesse sentido. A Doutrina considera que homem e mulher, feitos à imagem e semelhança de Deus, são inseridos na magnífica Criação com o dever de cultivar e proteger a Terra, compromisso de fé e, ao mesmo tempo, respeito ao genuíno sentido de humanidade. Somente o ser humano tem a prerrogativa e a condição para gerenciar a obra de Deus. Esse pressuposto torna possível reconhecer: o trabalho é elemento constituinte de todas as pessoas, que se realizam, forjando a própria identidade transcendente e vocacional, a partir de um ofício.
Por isso – entende a Doutrina Social da Igreja – o trabalho representa dimensão fundamental da existência. Trata-se de caminho para participar da obra da Criação, é expressão da plena humanidade ao longo da história. Com essa convicção, tem-se a clareza também de que cada ofício não pode ser contaminado por comodismos, preguiça, ou mesmo pela falta de responsabilidade na realização das próprias tarefas – posturas que comprometem o desenvolvimento integral. O trabalho é um direito e necessidade, permite o sustento e a realização pessoal, social e política, mas também é dever de todos.
Ninguém pode sentir-se no direito de não trabalhar, ou de executar mal as próprias atribuições. O trabalho humaniza, desenvolve o sentimento de corresponsabilidade, de pertencimento à sociedade. Perceba que trabalhar tem duas dimensões: a objetiva e a subjetiva. A primeira relaciona-se ao processo produtivo, enquanto o sentido subjetivo diz respeito ao agir de cada indivíduo – capaz de contribuir com projetos necessários à promoção do bem de todos.
O trabalho tem significação muito maior do que os recursos materiais e técnicos mobilizados para o exercício de determinada função, indo além do que se produz. Relaciona-se também com as contribuições de cada pessoa em diferentes âmbitos e integra a interioridade dos indivíduos. Quando se considera o mundo do trabalho, fundamental é priorizar a condição humana, para evitar enrijecimentos que façam prevalecer os interesses parciais, contrários ao bem comum. A dimensão social do trabalho é um chamado para que as pessoas se unam em uma grande rede comprometida com o próximo e com a sociedade.
Reconhecer essa dimensão social muito contribui para lidar com questões variadas, a exemplo da complexa relação entre capital e trabalho. Cada trabalhador passa a ser compreendido não apenas como instrumento para obtenção do lucro, mas como importante agente na reconstrução da sociedade. Quando se percebe o valor subjetivo do trabalho, a ecologia integral – que nunca exclui o ser humano – torna-se parâmetro dos projetos e ações.
Todos reconheçam: a intervenção humana diária nas obras da Criação, via trabalho, é sagrada. Precisa ser instrumento de Deus para fazer desabrochar o bem e a justiça. A todos, seja garantido o direito ao exercício sagrado do trabalho digno. E a cada pessoa que tem o seu ofício, uma convocação: vamos trabalhar, incansavelmente, para construir um novo mundo a partir do amor.
Por Dom Walmor Oliveira de Azevedo – Arcebispo de Belo Horizonte