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Histórias humanas tecidas de Norte a Sul do país compõem o grande mosaico que forma a Rede Cáritas no Brasil. Na luta pela garantia de direitos, acesso aos bens da terra, participação direta nas instâncias de decisão e de controle social, e ampliação das potencialidades de pessoas e territórios, homens e mulheres tecem novas trajetórias e abrem caminhos de esperança e vida.
“Eu trabalhava no lixão aqui de Caicó [PE]. Era uma pessoa que bebia muito e lá no lixão você sabe a pessoa não é vista pela sociedade. Mas o pessoal da Cáritas da diocese de Caicó fazia um trabalho de inclusão social com a gente. Se não fosse esse movimento de formar associação acho que eu já tinha até morrido. Hoje, graças a Deus, já fazem três anos que não bebo e até me casei, o importante é isso”. Conta Alcides Belamirno, que atualmente está na sua segunda gestão como presidente da Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Caicó (Ascamarca).
A Cáritas diocesana de Caicó presta assessoria técnica, administrativa e o acompanhamento social dos catadores e catadoras de materiais recicláveis e suas famílias, como afirma a articuladora das ações com catadores, Paula Salmana: “Este é um trabalho de assistência social que busca resgatar a dignidade dos trabalhadores e trabalhadoras da coleta seletiva, para que se sintam importantes enquanto pessoas e profissionais, e valorizadas pela a sociedade”, afirma.
O trabalho junto aos catadores e catadoras de materiais recicláveis constitui uma das áreas de atuação da Cáritas Brasileira e está fundamento na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). Neste sentido, a Cáritas busca fomentar a organização de cooperativas para que estes grupos possam participar ativamente da elaboração, por exemplo, dos planos estaduais e municipais de resíduos sólidos.
De acordo com o Perfil dos Municípios Brasileiros (Munic 2017), divulgado Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em julho deste ano, quase metade das 5.570 cidades brasileiras ainda não tem um plano integrado para o manejo dos resíduos e o prazo para que todos os municípios dessem destino correto ao lixo venceu há quatro anos. Cada brasileiro gera em média 378 kg de resíduos ao ano, um volume que daria para cobrir um campo e meio de futebol.
Pastoralidade transformadora
Desde 1953 a Cáritas tem marcado a história do Brasil, principalmente pelas suas ações de solidariedade, como destaca o arcebispo de Aracaju e presidente da Cáritas Brasileira, dom João da Costa. “Nos últimos tempos um dos trabalhos desenvolvidos com grande esforço e buscando a integração de toda Igreja é o serviço junto às pessoas em situação de migração e refúgio. Estamos olhando para os países que estão em nossas fronteiras, especialmente neste momento para a Venezuela, e buscando formas de ajuda, acolhimento e integração das pessoas que chegam ao Brasil em busca de uma vida melhor. Assim, a Cáritas tem procurado viver cada vez mais a solidariedade e o compromisso com os mais empobrecidos”, afirma o arcebispo.
Segundo dom João, a Cáritas Brasileira de diversas formas expressa sua missão de testemunhar Jesus Cristo no mundo de hoje. “Procuramos atuar nas realidades da política, nas realidades de exclusão e nos espaços onde surgem apelos fortes para a solidariedade. Testemunhar Jesus na pessoa de tantos irmãos que estão com fome, doentes ou abandonados conforme está no Evangelho de Mateus, capítulo 25: ‘Vinde benditos de meu Pai!’, essa é nossa grande missão. É com essa perspectiva de esperança que olhamos para a Cáritas Brasileira, para seus agentes contratados e voluntários que buscam viver o amor encarnado nas diversas realidades de exclusão”, conclui.
Comunidades mais seguras
Em uma ação que envolveu nove dioceses, a Cáritas Brasileira, no Regional Rio Grande do Sul, mobilizou grupos e pessoas na recuperação de 400 fontes e nascentes na região, além de movimentar as comunidades no processo de construção de cisternas.
Inicialmente a perspectiva deste trabalho no campo socioambiental era o debate com as comunidades sobre questões como as mudanças climáticas, o atual modelo de desenvolvimento predatório, além de ver em cada território, quais eram as ocorrências de eventos de emergência, quais as causas desses eventos e o que poderia ser feito no campo da prevenção.
A assessora da Cáritas Brasileira, no Regional Rio Grande do Sul, Jacira Dias, conta que o levantamento junto às comunidades chamou atenção para uma questão pouco visibilizada, mas muito recorrente região, a estiagem: “Muitas comunidades sofrem com a falta de água para o consumo humano, para a produção agrícola e criação de animais. A gente começou a refletir sobre isso, sentimos a necessidade e vimos a possibilidade de trabalharmos para a identificação das fontes de água, a situação dessas fontes, que em sua maioria estavam abandonadas, impuras, sujas”, conta.
Com a ajuda técnica da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), as comunidades mobilizadas pelas Cáritas iniciaram um trabalho de identificação das nascentes e estabeleceram ações para proteção desses espaços, com pequenas intervenções como limpeza da área e plantação de árvores nativas ao redor. “Nós procuramos intervir o mínimo possível nessas fontes, mas iniciamos um processo em vista da reabilitação para que pudessem voltar a produzir um volume maior de água e para que essa água fosse potável. Ao verem os impactos positivos, as pessoas se entusiasmaram, começaram a desenvolver e multiplicar essa tecnologia social da recuperação das fontes”, relata a assessora.
Tudo começou com o apoio da Cáritas Alemã no Projeto Prevenção de Emergências Construindo Comunidades mais Seguras, depois o projeto recebeu também apoio do Fundo Nacional de Solidariedade (FNS) e ampliou sua atuação na perspectiva do desenvolvimento de ações para o saneamento básico rural. “Fizemos seminários e ações voltadas para o saneamento básico rural, isso foi bem inovador porque o tema do saneamento é visto como uma ação necessária apenas no mundo urbano. As ações de instalação de saneamento básico rural foram feitas nas dioceses de Santa Maria, Santo Ângela, Vacaria e Santa Cruz do Sul”, conta Jacira.
Uma das famílias integradas nas ações apoiadas em projetos da Cáritas Brasileira e beneficiadas com os recursos do Fundo Nacional de Solidariedade, hoje produz alimentos orgânicos onde antes cultivava fumo. Isso foi possível graças há uma série de ações com a comunidade. “Antes disso nós tínhamos muitas dificuldades com água limpa para o consumo. Os benefícios são muitos, hoje tomamos água de qualidade em minha casa, hoje produzimos alimentos que geram vida!”, conta Miraci Terezinha Sippert Schu, ex-produtora de fumo que agora colhe alimentos orgânicos em sua propriedade que fica em Agudo (RS).
“Entre as ações socioambientais que fizemos juntos me marcou o plantio de árvores na beira de um riacho que atravessa toda a propriedade, envolvendo a escola da localidade. As crianças participaram. Outro momento importante foi a recuperação de fontes e a construção da cisterna envolvendo os indígenas, num dia de campo deu até banho de sanga, foi maravilhoso”, complementa Miraci.
Segundo Jacira Dias, toda a mobilização tem também como objetivo chamar atenção para a necessidade de políticas públicas que viabilizem essas ações, mas mesmo sem recursos as comunidades seguem em atividade. “Nós continuamos buscando recursos para prosseguir essas ações, mas neste momento não temos nenhuma ajuda para tocar o projeto. A recuperação de fontes é muito simples e exige pouco recurso, já a construção de cisternas e o saneamento básico rural demandam mais recursos financeiros porque precisam de materiais. Uma questão muito relevante é o fato de que procuramos fazer essas ações em mutirão, chamando a comunidade, convocando as pessoas para participar, como uma forma de resgate da cooperação necessária e também como algo pedagógico, porque ficam os aprendizados e o fortalecimento dos laços comunitários. Ter o recurso do Fundo Nacional de Solidariedade (FNS) em 2017 foi fundamental para esta ação ganhar força e uma forma de colocar em prática o que discutimos durante a Campanha da Fraternidade”, conclui Jacira.
Para mobilizar comunidades e chamar atenção dos poderes públicos para questões no setor socioambiental, a Cáritas Brasileira desenvolve projetos por meio da área de atuação Meio Ambiente Gestão de Riscos e Emergências (Magre).
Juventudes na cena
“A Família Hip-Hop a gente criou quando adolescentes, a gente era um grupo de pichadores, então a gente teve uma ideia um dia de formar a Família Hip-Hop. Na época, em Brasília, o hip- hop estava muito em evidência, todo mundo tinha ideia de cantar rap e a gente falou: Vamos cantar rap? Não, vamos fazer melhor, vamos juntar os grupos da cidade e fazer um coletivo, vamos chamar vários grupos. Assim que a gente formou a Família Hip-Hop, aliás, não era nem Família Hip-Hop, era outro nome, Clã Hip-Hop”. O relato é de Alex Martins, um dos idealizadores do projeto, hoje produtor cultural e diretor do Núcleo de Formação Popular Família Hip-Hop. “A princípio era diversão para nós, eu tinha 17 anos, era diversão para nós cantar rap nos bairros e tal, aí o tempo foi passando, começamos a entrar em escolas, fazer oficinas nas escolas e a coisa foi tomando um tempo da nossa vida”, relata o diretor que hoje lidera uma série de ações na sede do coletivo.
Foi com o incentivo de moradores de Santa Maria, região administrativa do Distrito Federal, onde o projeto está sediado, que os membros do coletivo pensaram pela primeira vez em tornar aquela ação de jovens entusiastas em um projeto estruturado e com reconhecimento como Organização Não Governamental (ONG). “A ideia agora é trazer mais jovens e ampliar o coletivo, sempre ampliar, trazer para cá e fazer parte do coletivo, atendemos as pessoas e fazemos um trabalho para a comunidade. A comunidade tem que saber que isso existe e saber que é dela, saber que ela pode utilizar o espaço”, afirma Martins.
A partir dos incentivos e assessoria técnica da Cáritas Arquidiocesana de Brasília, o coletivo Família Hip-Hop passou a conhecer e utilizar os princípios da Economia Popular Solidária, primeiro por meio de um bazar organizado no bairro, depois com a produção e comercialização de materiais como relata Martins. “A ideia é essa, gerar renda para nós, desenvolver as coisas para nós, e a ideia de Economia Solidária, além de pensar uma economia diferente da que tá ai, é trabalhar em redes, fortalecer as redes, a ideia das redes para nós é fundamental”.
Atualmente o grupo cria peças como camisetas, bonés e copos usando a arte da serigrafia, os recursos da venda desses materiais permitem a sustentabilidade do projeto que promove integração social e participação da comunidade em processos de formação política e econômica, sempre valorizando o viés cultural e as potencialidades das juventudes locais.
Texto: Jucelene Rocha
Colaboração: Fabiana Silva e Osnilda Lima
Rede de Comunicadores/as da Cáritas Brasileira
Via CNBB