Economista dá dicas para organizar as finanças no fim de ano
12/12/2017Coleta da Campanha para a Evangelização acontece neste domingo
12/12/2017“Eu sempre penso que a violência é uma coisa aprendida. E se é aprendida, também pode ser desaprendida”. Desta forma padre Vilson Groh, 62 anos, sintetiza a compreensão que orienta sua atuação nas periferias da grande Florianópolis (SC), há 35 anos, num reconhecido trabalho que chegou a chamar a atenção do papa Francisco.
O padre que busca “agarrar” a esperança que se esconde por traz dos olhos da população empobrecida, especialmente dos jovens negros, público prioritário do seu trabalho, só acredita ser possível construir um caminho de paz por meio da atuação em redes de projetos, que envolvam governos e sociedade civil na criação de novos espaços públicos não estatais e de controle social, num grande pacto de luta contra a violência.
O religioso tira conclusões da própria experiência. Ele chegou a Florianópolis (SC) aos 22 anos, após cursar filosofia na Fundação Educacional de Brusque, sua terra natal. Na capital do estado começou a fazer Teologia. Em 1983, no último ano do curso, iniciou um trabalho no morro Mocotó, uma das áreas mais pobres da cidade. Foi aí que iniciou a luta pela regularização fundiária, urbanização do local e acolhimento de crianças, jovens e adultos, trabalho que se expandiu para outros territórios. Neste período, segundo ele, foram regularizadas e urbanizadas mais de 64 áreas de terra na grande Florianópolis.
Há cinco anos, o padre criou o Instituto Vilson Groh (IVG), organização que articula uma série de projetos e entidades e que, só nos primeiros dois meses de 2017, atendeu mais de 5 mil crianças, adolescentes e jovens por meio de seus diferentes projetos. Em 2016, foram 16 mil.
Tendo a educação como prioridade, o IVG apresenta um horizonte palpável de esperança às crianças, adolescentes e jovens, com os quais desenvolve um projeto pedagógico e de vida que vai dos 6 anos ao ingresso na Universidade. Foi este trabalho que despertou a atenção do papa Francisco que o convidou para uma audiência no Vaticano, em fevereiro deste ano.
A capacidade de mobilização do padre Vilson Groh vem mudando não apenas o acesso à moradia, mas também o colorido das paisagens por onde passa. Por meio do projeto Mocotó Cor e do trabalho voluntário, um exemplo de intervenção nos bairros onde atua, ele vem dando um colorido especial às fachadas das casas.
“Só por meio da nossa capacidade de fazer uma opção pelas periferias geográficas, como diz o papa Francisco, e se deixar tocar por essas realidades; Por meio da compreensão de uma Igreja em saída, entrando nestas ‘galileias’ empobrecidas e voltando ao método de Jesus, o método do encontro”, o religioso que vem transformado territórios e pessoas, acredita ser possível superar a violência e construir um caminho de paz.
As ideias do padre foram tomando forma na década de 80 primeiro por meio da Associação de Amigos da Casa da Criança do Adolescente do Mocotó, que hoje faz parte do Instituto Vilson Groh. Hoje a rede IVG abrange o Centro de Educação Popular, o Centro Cultural Escrava Anastácia, o Centro Social Elisabeth Sarkamp, o Centro Cultural Marista São José, a Associação João Paulo II e o Centro Educacional Marista Lúcia Mayvorne. O IVG oferece ainda cursinho pré-vestibular gratuito para os jovens da periferia.
As periferias geográficas de que fala o papa Francisco coincidem com a reflexão proposta pela Campanha da Fraternidade 2018 que, encarando o tema da violência, fala em seu texto-base da existência de territórios marcados pela extrema violência. No próximo ano, a Igreja no Brasil vai refletir sobre o tema e suas diferentes formas de manifestação direta, indireta e institucional na perspectiva da sua superação e da construção de uma cultura da paz.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a violência pelo uso intencional da força contra si mesmo, contra outra pessoa ou contra um grupo de pessoas, de modo a resultar em dano físico, sexual, psicológico ou morte.
Segundo o arcebispo de Brasília (DF) e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cardeal Sergio da Rocha, há um clamor pela superação da violência, nas suas variadas formas, que tanto sofrimento tem trazido ao povo brasileiro. “Com a CF 2018, esperamos poder envolver as comunidades e a todos, estimulando a reflexão e a busca de soluções para a sua superação”, diz.
Guerra letal e silenciosa – O tema que está no centro das preocupações dos brasileiros figura nas pesquisas que apontam o Brasil como um dos países mais violentos do mundo. A nota técnica do Atlas da Violência, de março de 2016, fruto da parceria do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, demonstra que apesar de possuir menos de 3% da população mundial, o país responde por quase 13% dos assassinatos no planeta. Em 2014, o Brasil chegou ao topo do ranking, considerado o número absoluto de homicídios. Foram 59.627 mortes segundo o Ipea.
Os números apontados pelo Mapa da Violência 2016, organizado pela Flacso, mostram que, no Brasil, cinco pessoas são mortas por arma de fogo a cada hora. A cada único dia são 123 pessoas assassinadas dessa forma. Essas cifras revelam que, no Brasil, ocorrem mais mortes por arma de fogo do que nas chacinas e atentados que acontecem em todo o mundo. Contam-se mais homicídios aqui do que em diversas das guerras recentes.
O especialista em segurança pública Robson Sávio Reis Souz, professor da PUC Minas, chama a atenção para o fato do Brasil ser o décimo país mais desigual, apesar de ser a oitava maior economia do mundo, de acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2016. A desigualdade social, segundo ele, é um dos principais fatores do crescimento da violência no país.
Com o aumento da criminalidade a partir da década de 80, consolidou-se um contexto de impunidade que, somado à maior procura por drogas ilícitas e a maior disponibilidade de armas de fogo, formou o ambiente no qual se deu o crescimento dos homicídios e de outros crimes contra a pessoa e contra o patrimônio, explica o professor que integra o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Autor do livro Quem comanda a segurança pública no Brasil: atores, crenças e coalizões que dominam a política nacional de segurança pública, da editora Letramento, diz que a violência no Brasil tem um caráter seletivo. “A maioria das vítimas da violência são pobres, negros, jovens e moradores da periferia. É uma violência seletiva. Não atinge a todos. No Brasil, há locais mais seguros que a Europa e mais violentos que a Síria”, disse.
Um dado que exemplifica o caráter seletivo da violência citado pelo professor é o que aponta que entre jovens de 15 a 24 anos, os homicídios são a principal causa de morte. Dados referentes ao ano de 2011 mostram a gravidade da tragédia. Naquele ano houve, em todo o país, mais de 52 mil mortos por homicídio. Desse total, mais da metade das vítimas eram jovens (52,63%). Dentre tais jovens vitimados, a imensa maioria era composta por negros (71,44%), majoritariamente do sexo masculino (93,03%).
Entre 2001 e 2011, os homicídios de mulheres cresceram 17,2%. Somente no ano de 2013, houve 4,8 homicídios por 100 mil mulheres, segundo o Mapa da Violência publicado em 2015. Tendo registrado naquele ano 4.762 homicídios de mulheres – 13 homicídios diários, em média –, o Brasil ocupa a quinta colocação, numa lista de 83 países. Ocorrem aqui 2,4 vezes mais homicídios de mulheres do que a média internacional.
O presidente da CNBB, cardeal dom Sergio Rocha, reforça que a superação da violência necessita da ação efetiva dos três poderes, especialmente da implantação de políticas públicas. “Os caminhos de superação passam sempre pelo diálogo, pela misericórdia, pela justiça social e pela educação para a paz”, afirma. O arcebispo lembra que nas campanhas da fraternidade, a palavra de Deus sempre ilumina e orienta o caminhar da Igreja. Na CF 2018, reforça o cardeal, o lema “Em Cristo, somos todos irmãos”, motiva a construir a fraternidade como caminho para alcançar a paz.
Matéria publicada na edição nº 21 da Revista Bote Fé da Edições da CNBB