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15/08/2018
A proximidade do Encontro Mundial das Famílias é um momento oportuno para refletir sobre a família e entender a missão de cada um que a constitui: homem, mulher e os filhos, além da importante participação dos avós.
Nesta reportagem, o assunto em questão é o “ser homem”. A crise da masculinidade é um problema atual que tem afetado as famílias, os filhos e, por consequência a sociedade. O próprio homem cristão, muitas vezes, não tem consciência de sua missão ou não a assume.
Essa realidade levou o bispo da Diocese de Phoenix, Estados Unidos, Dom Thomas Olmsted, a escrever a Exortação Apostólica ‘Into the Breach’ [‘Firmes na Brecha’] sobre a masculinidade, na qual afirma que cada homem católico deve estar preparado para manter-se firme na brecha, entrar em combate espiritual, defender a mulher e a família.
Segundo o bispo, pela primeira vez na história o ser humano está tão confuso, ou tão arrogante, que busca determinar por si mesmo sua própria masculinidade e feminilidade.
No documento, publicado em 2015, e disponível em inglês, o bispo responde a questões, como: o que é ser homem? como devem amar os homens católicos? e por que a paternidade é crucial para o homem?
Em entrevista ao Canção Nova, Dom Olmsted fala sobre a crise da masculinidade e destaca o problema do machismo, comum na cultura latino-americana. Ele alerta ainda para que o homem resista às “noções seculares inúteis” de competitividade entre homens e mulheres, aponta como surgem os maiores vícios do homem e defende que, mesmo tendo crescido sem uma boa referência de pai, o homem pode assumir sua paternidade.
Leia a entrevista completa:
Como esta crise de masculinidade pode afetar a família e a sociedade?
Dom Thomas Olmsted: A crise de masculinidade tem afetado a família criando uma ferida em muitos homens e mulheres que cresceram sem um pai ou cresceram com um pai que enquanto estava em casa era completamente ausente na maior parte do tempo. Para os homens, o resultado é a ausência de um modelo no qual possam se inspirar enquanto exercem sua paternidade. Para as mulheres, esta ausência tende a levá-las a relações românticas com homens muito precocemente. Elas procuram preencher este vazio, que não pode ser preenchido, desta maneira.
A sociedade entrou neste círculo vicioso em que o elemento que falta é a presença do amor, que envolve, que é comprometido e com uma figura paternal responsável. Na cultura latino-americana nós ainda adicionamos o elemento do machismo, que ensina aos homens a seguir uma caricatura do que a masculinidade realmente é. E ainda há o complexo fenômeno da imigração, que força muitos bons pais e maridos a deixar suas famílias para trás a fim de conseguir dinheiro em outro lugar para provê-los em suas necessidades materiais. Eles acabam negligenciando os aspectos afetivos e espirituais de sua paternidade.
Um homem que cresceu sem referência pode aprender a ser um bom pai? Como ele pode cumprir sua missão?
Dom Thomas Olmsted: Sim, sempre há esperança em Deus, e esta é a boa notícia para todos os pais. Deus colocou nos homens a capacidade de inspirar uns aos outros para a grandeza. Os homens católicos que não tiveram pais para guiá-los e servir como um modelo de regra para a paternidade ainda podem aprender a serem bons pais. Isto é feito principalmente por meio da graça. Ao buscar um relacionamento com Deus, o Pai, podemos adquirir confiança, força e amor que um pai deve ter com seus próprios filhos. O Pai não deixará de responder as nossas preces para nos tornarmos bons pais para nossos filhos. Por meio deste processo as feridas serão curadas pela graça de Deus para transformar o homem no pai que Deus quer que ele se torne.
E também é importante que homens católicos procurem pela amizade de outros sinceros homens católicos que por meio de laços de fraternidade possa atentá-los sobre a responsabilidade a fim de que cumpram sua missão como pais. Na cultura da América Latina essas amizades surgem muito naturalmente, por meio de esportes como o futebol, trabalho, música ou quaisquer outras manifestações culturais. Mas os homens devem estar certos de que procuram por amizades virtuosas, porque o diabo também pode seduzir os homens a agir de maneira errônea por meio de amizades falsas.
Como um homem católico deve ser? Qual é a identidade do homem cristão e como deve ser sua vivência?
Dom Thomas Olmsted: Para um homem católico, a fonte primária de sua identidade – ser um filho de Deus -, deve nortear os seus atos. Como filhos de Deus, podemos aprender com o Filho de Deus, Jesus Cristo, o que significa verdadeiramente ser um homem cristão. Para isto é necessário viver de forma verdadeira nossa fé cristã e nos beneficiarmos de tudo que Deus nos deu. Devemos procurar crescer em santidade. Devemos aprofundar nosso conhecimento e amor a Jesus Cristo por meio dos sacramentos e uma consistente vida de oração. Em minha Exortação Apostólica ‘Into the Breach’ [‘Firmes na Brecha’, em tradução literal], listei uma série de práticas concretas que todo homem católico deve realizar mensalmente, semanalmente e diariamente. Todas elas ajudarão os homens a crescer em sua identidade como filho de Deus.
O exemplo dos santos, muitos dos quais recomendo em minha Exortação Apostólica, pode ajudar muito. Encontre um santo com quem você possa se relacionar como um homem de verdade e peça ajuda através das suas orações: São José, São Josemaria Escriva, São João Paulo II, São Maximiliano Maria Kolbe… esses foram homens reais, todos diferentes, mas todos fortes, confiáveis e repletos das águas profundas da fé, que lhes deu forças para viver grandes vidas para o Senhor. Encontre um e o ame. Aprenda com ele. Peça que ele reze por você como seu santo patrono.
Em nossa sociedade atual, pode-se perceber uma “luta” entre homem e mulher, dificultando a noção de complementaridade. Como o homem complementa a mulher e vice-versa?
Dom Thomas Olmsted: Para todos os homens católicos em toda a América ― muitos dos quais cresceram tragicamente sem ter a experiência de ter um pai ― o papel da mãe já é muito importante. Não acredito que muito desses homens veem uma competição entre homens e mulheres. Suas próprias experiências deixam bem claro o quão fortes e determinadas as mulheres podem ser para sustentar uma família e proteger suas crianças. Sabemos que Deus criou os homens e mulheres iguais em dignidade, mas diferentes do ponto de vista biológico e emocional. Essas diferenças devem ser celebradas e não minimizadas. Eles se complementam, são diferenças que trazem força.
Os homens católicos devem resistir às noções seculares inúteis de competitividade entre homens e mulheres. Devemos todos pedir à Nossa Mãe Celestial, à Nossa Senhora de Guadalupe, pela graça de enxergarmos a beleza única e o papel que Deus tem para as mulheres na Igreja e na sociedade. Devemos apreciar como o papel da mulher complementa perfeitamente o papel que Deus tem para o homem na sociedade. Ambos são fortes, com diferenças e forças necessárias. Ambos são chamados para serem discípulos de Jesus, que amam a Deus e ao próximo. Ambos, especialmente juntos, são a imagem de Deus. Esta é verdade mais profunda. Conflitos acontecem em todos os relacionamentos, mas com a graça de Deus esta pode ser uma ocasião para crescer. A tão falada ‘batalha dos sexos’ parece, em grande parte, movida pela mídia. Somos todos chamados para apreciar as diferenças!
Como o senhor vê o machismo em relação à sociedade hoje em dia?
Dom Thomas Olmsted: Acredito que chauvinismo e machismo ainda são altamente presentes na sociedade, particularmente na sociedade latino-americana. Para alguns, significa quebrar correntes pesadas demais. Eles são o resultado de gerações de homens que não souberam interpretar o papel dos homens e das mulheres na sociedade. O que poderia ter começado com um instinto natural de proteção para os homens desenvolvidos ao longo dos anos em um atitude paternalista em relação às mulheres. A sociedade latino-americana tradicionalmente viveu isto. Precisamos ser cuidadosos para não jogarmos as mulheres contra os homens, ou vice-versa, mas sim promover o respeito e o amor entre nós, como iguais em dignidade e valor.
Devemos trabalhar de forma dura e intensa a fim de pararmos com o chauvinismo. Aqueles homens para os quais o véu já caiu de seus olhos devem ensinar seus filhos a respeitar as mulheres e tratá-las da maneira que Cristo trata Sua Igreja. Os homens também devem ensinar suas filhas a esperar e exigir respeito, além de um tratamento afetuoso vindo dos homens.
Em sua exortação, o senhor diz que a pessoa que não domina suas paixões não poderá se conhecer, citando como exemplo a falta de domínio sobre a comida e o sexo. O senhor acha que os maiores vícios do homem surgem daí? E como lidar com isso?
Dom Thomas Olmsted: Os maiores vícios dos homens surgem por não conhecerem a pessoa de Jesus Cristo. Conhecer Jesus é amá-lo. E amá-lo é querer agradá-lo e imitá-lo. Fora este desejo em ser mais parecido com Cristo, os homens cristãos devem procurar desenvolver uma virtude. E isto é seriamente necessário.
Os vícios prosperam quando não conhecemos e amamos a Deus, e também da falta de virtude. Quando um homem se deixa levar pela luxúria ou a gula, é porque ele não desenvolveu amor e intimidade suficientes com Deus para querer se tornar virtuoso.
A cultura latino-americana tem um forte paixão pela beleza. Esta paixão, que surge de um desejo natural pelas coisas de Deus, pode se tornar um amor desordenado pelo sexo ou a comida. Isto é claramente refletido na celebração do carnaval no Brasil, por exemplo. O que começou na Europa como uma demonstração inocente de beleza foi corrompida em algumas partes da América em uma desordenada exibição de vícios. Os homens devem constantemente se esforçar para se conhecerem, para aprender a autonegação e para buscar a santidade. Fazemos isto cultivando uma vida virtuosa. É assim que você controla os grandes vícios do homem. Você luta contra eles com a virtude e a graça de Deus.
Tradução: Thiago Coutinho
Via Canção Nova