O Papa no Angelus: a estagnação não combina com o testemunho cristão e a missão da Igreja
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No início da missa, as luzes da Basílica Vaticana foram apagadas e por alguns instantes o templo foi iluminado pelas velas acesas que os consagrados seguravam em suas mãos. Uma pequena chama semelhante à luz do chamado que um dia Jesus acendeu em seus corações.
O pontífice iniciou sua homilia com a seguinte passagem bíblica: “«Meus olhos viram a Salvação»: são as palavras de Simeão, que o Evangelho apresenta como um homem simples, um homem «justo e piedoso». Mas, dentre todos os homens que estavam no templo naquele dia, só ele viu, em Jesus, o Salvador. Um menino; um pequenino, frágil e simples menino. Nele viu a Salvação, porque o Espírito Santo lhe fez reconhecer, naquele terno recém-nascido, «o Messias do Senhor»”.
Acolher de braços abertos o dom do Senhor
Também vós, queridos irmãos e irmãs consagrados, sois homens e mulheres simples que vistes o tesouro que vale mais do que todas as riquezas do mundo. Por ele, deixastes coisas preciosas, tais como bens, criar uma família própria. Por que o fizestes? Porque vos apaixonastes por Jesus, n’Ele vistes tudo e, fascinados pelo seu olhar, deixastes o resto. A vida consagrada é esta visão. É ver aquilo que conta na vida. É acolher de braços abertos o dom do Senhor, como fez Simeão. Isto é o que veem os olhos dos consagrados: a graça de Deus derramada em suas mãos. A pessoa consagrada é alguém que, ao olhar-se cada dia, diz: «Tudo é dom, tudo é graça». Queridos irmãos e irmãs, não é mérito nosso a vida religiosa, é um dom de amor que recebemos.
Segundo o Papa, “saber ver a graça é o ponto de partida. Olhar para trás, reler a própria história e ver nela o dom fiel de Deus, não apenas nos grandes momentos da vida mas também nas fragilidades, fraquezas e misérias. O tentador, o diabo insiste precisamente em nossas misérias, em nossas mãos vazias, e corremos o risco de perder a bússola, que é a gratuidade de Deus. Com efeito, Deus nos ama e sempre se oferece a nós, mesmo nas nossas misérias. Quando mantemos o olhar fixo n’Ele, abrimo-nos ao perdão que nos renova e somos confirmados pela sua fidelidade”.
“Com efeito, sobre a vida religiosa, paira esta tentação: ter um olhar mundano. É o olhar que já não vê a graça de Deus como protagonista da vida e vai à procura de qualquer substituto: um pouco de sucesso, uma consolação afetiva, fazer finalmente aquilo que quero”, frisou o Papa.
“A vida consagrada, quando deixa de girar em torno da graça de Deus, retrai-se no próprio eu: perde impulso, acomoda-se, paralisa.”
E sabemos o que acontece depois! Reivindicam-se os espaços próprios e os direitos próprios, deixamo-nos cair em críticas e murmurações, indignamo-nos pela mais pequena coisa que não funcione e entoamos a ladainha da lamentação acerca dos irmãos, das irmãs, da comunidade, da Igreja e da sociedade. Já não se vê o Senhor em tudo, mas só o mundo com as suas dinâmicas; e o coração se restringe.
Castidade, caminho para amar sem se apoderar
A fim de ter um olhar justo sobre a vida, Francisco convidou os consagrados a pedirem para “saber ver, como Simeão, a graça de Deus que veio para nós. O Evangelho repete três vezes que Simeão tinha familiaridade com o Espírito Santo, que estava nele, o inspirava e impelia. Tinha familiaridade com o Espírito Santo, com o amor de Deus”.
“A vida consagrada, se permanecer firme no amor do Senhor, vê a beleza. Vê que a pobreza não é um esforço titânico, mas uma liberdade superior, que nos presenteia como verdadeiras riquezas Deus e os outros. Vê que a castidade não é uma esterilidade austera, mas o caminho para amar sem se apoderar. Vê que a obediência não é disciplina, mas a vitória, no estilo de Jesus, sobre a nossa anarquia.”
A seguir, o Papa contou uma experiência vivida por algumas religiosas: “Numa das terras onde ocorreu o terremoto, falando de pobreza e vida comunitária, havia um mosteiro beneditino. Outro mosteiro convidou as religiosas para se mudar e viver nesse mosteiro. Elas ficaram ali pouco tempo mas não eram felizes, pensavam no lugar que tinham deixado, nas pessoas de lá. No final, decidiram voltar e fazer o mosteiro em dois trailers. Em vez de estarem num grande mosteiro, confortáveis, eram como pulgas, ali, todas juntas, mas felizes na pobreza. Isso aconteceu no ano passado. Uma coisa bonita!”
Olhar dos consagrados, olhar de esperança
“Quem mantém o olhar fixo em Jesus, aprende a viver para servir. Não espera que os outros comecem, mas vai à procura do próximo, como Simeão que procurava Jesus no templo”, disse ainda Francisco. “E onde se encontra o próximo, na vida consagrada? Primeiramente, na própria comunidade. Devemos pedir a graça de saber procurar Jesus nos irmãos e irmãs que recebemos. É aqui que se começa a praticar a caridade: no lugar onde se vive, acolhendo os irmãos e irmãs com as suas pobrezas, como Simeão acolheu Jesus simples e pobre. Há muitos, hoje, que só veem nos outros obstáculos e complicações. Há necessidade de olhares que procurem o próximo, que aproximem de quem está distante. Como homens e mulheres que vivem para imitar Jesus, os religiosos e as religiosas são chamados a tornar presente no mundo o olhar d’Ele, o olhar da compaixão, o olhar que vai à procura dos distantes, que não condena, mas encoraja, liberta, consola.”
“O olhar dos consagrados só pode ser um olhar de esperança”, disse ainda o Papa. “Saber esperar. Olhando ao redor, é fácil perder a esperança: as coisas que estão mal, a diminuição das vocações, etc. Paira ainda a tentação do olhar mundano, que aniquila a esperança”.
Francisco concluiu a sua homilia, dizendo que Simeão e Ana “eram idosos, viviam sozinhos e contudo não perderam a esperança, porque estavam em contato com o Senhor”. “Ana «não se afastava do templo, participando do culto noite e dia, com jejuns e orações». Aqui está o segredo: não se afastar do Senhor, fonte da esperança.”
Via Vatican News