Como vimos nos últimos textos, João Bosco experimentou algumas frustrações em seu ano de estudos em Castelnuovo. Em primeiro lugar, a troca de professor na escola, que não conseguia manter a ordem em sala de aula e fez com que o ano escolar fosse quase que perdido. Por consequência disso, as hostilidades que João enfrentava por parte dos seus colegas por ser maior do que eles e por vir dos Becchi, uma região essencialmente rural. E em segundo lugar, como dito na semana passada, a tristeza por não conseguir manter uma relação de amizade e de proximidade com os padres locais (em contraste com a grande amizade que teve com o Pe. Calosso e com o Pe. Virano, seu professor que foi transferido).
Entretanto, o ano em Castelnuovo não foi uma perda total. A decepção com os padres, por exemplo, fez João Bosco amadurecer a ideia de ter um contato completamente diferente com os jovens, caso viesse a se tornar sacerdote. Também os ofícios de músico e de alfaiate, aprendidos nos tempos livres com o Sr. Roberto, dono da casa onde ficava, e o ofício de ferreiro, aprendido com o Sr. Evásio Sávio, serão muito importantes no futuro quando Dom Bosco iniciar as escolas profissionais em seu oratório.
Mas claro: João termina o ano escolar desiludido e desmoralizado pelo seu professor e pelos seus colegas. Chegará a dizer nas Memórias do Oratório que “aquele trato desrespeitoso e humilhante do sacerdote, quase havia feito perder tudo o que havia aprendido nos meses anteriores. É nesta situação que o jovem Bosco vai para as suas férias de verão-outuno de 1831, no sítio de Sussambrino, em uma propriedade que seu irmão José assumiu com um amigo para cultivar a terra. Também Mamãe Margarida havia deixado os Becchi para morar com seu filho José.
João aproveitou as férias para estudar muito. Mas não queria ser um peso para o seu irmão. Por isso ajudava nos trabalhos do campo. Mas empregava tanto tempo para a leitura que chegava até a descuidar dos animais, enquanto vigiava o pasto.
E ele não estava sozinho com a sua família em Sussambrino. Lá havia o seu amigo José Turco, um menino mais velho que conheceu em Castelnuovo. Pessoa excelente e um ótimo cristão. A família de Turco era proprietária de terras e de uma vinha vizinha à casa do irmão de João. José Turco teve a oportunidade de testemunhar no processo de beatificação de Dom Bosco e contar que, nestas férias de 1831, João havia contado para ele e para sua irmã Lúcia Turco, um sonho que confirmava a sua vocação.
Tratava-se de uma repetição do mesmo sonho dos nove anos de idade. João se viu novamente no mesmo vale do primeiro sonho, o mesmo rebanho de ovelhas e a Senhora de aspecto resplandecente. “Torna-te humilde, forte e robusto – repetira – e a seu tempo tudo compreenderás”.
Um fato interessante na vida de João nestas férias se deu na festa do padroeiro da aldeia de Montafia. Era perto de Sussambrino. João ficou sabendo que teria “pau-de-sebo” na festa e que entre os prêmios teria uma bolsa de 20 liras. Era bastante dinheiro para João. Em Moncucco, precisaria trabalhar um ano para ganhar 15 liras!
O pau-de-sebo era muito alto, listo e encharcado de óleo e banha. A rapaziada toda do lugar ficava olhando o aro de ferro onde estavam pendurados pacotes, salames, garrafas de vinho e a bolsa com o dinheiro. De vez em quando alguém tentava a escalada, com muita torcida do público. Mas o “gás” acabava na metade do caminho… E caía de volta, em meio às vaias e os assobios.
João estudou bem a situação, cuspiu nas mãos e se grudou no poste. Foi subindo calmamente e, de vez em quando, se assentava nos calcanhares e descansava. E o povo embaixo, gritando. João, porém, estava tranquilo. Ficaria ali o dia inteiro se fosse preciso.
Avançando sempre com muita calma, chegou até onde o mastro ficava mais fino. Respirou, deu os últimos impulsos. O povo já estava em silêncio, na expectativa. João conseguiu pegar a bolsa com as 20 liras e a segurou com os dentes. Ainda catou mais um salame e um lenço. E deslizou para baixo.
Durante este tranquilo período de férias no sítio, João, com o seu irmão José e Mamãe Margarida e, sem dúvida, seu tio Miguel e, possivelmente, sua tia Mariana, puderam avaliar com calma a experiência de Castelnuovo. A decisão foi que João não voltasse para lá, mas pedisse uma vaga na escola secundária de Chieri.
Pe. Glauco Félix Teixeira Landim, SDB
Animador das dimensões Vocacional, Missionária e de Evangelização e Catequese da Pastoral Juvenil Salesiana
E-mail: [email protected] / Facebook: www.facebook.com/glaucosdb
ESPAÇO VALCOCCO – CAPÍTULOS
Capítulo 1: Espaço Valdocco: somos Dom Bosco que caminha
Capítulo 2: Um começo de vida marcado pela pobreza e por uma fatalidade
Capítulo 3: Uma mãe corajosa, amorosa e cheia de fé
Capítulo 4: Antônio, José e João: três irmãos muito diferentes
Capítulo 5: O início dos estudos de João Bosco e o começo dos conflitos familiares
Capítulo 6: Um sonho que ficou gravado profundamente na mente
Capítulo 7: Um sonho que é memória e profecia
Capítulo 8: Um sonho que envia um pastor para os jovens
Capítulo 9: Um saltimbanco de Deus
Capítulo 10: Deus tomou posse do teu coração
Capítulo 11: A fúria de Antônio
Capítulo 12: Um lugar com a família Moglia
Capítulo 13: Uma experiência rica de família e trabalho
Capítulo 14: Um tempo para aprender a falar com Deus
Capítulo 15: Um amigo inesperado
Capítulo 16: Um pai para Joãozinho Bosco
Capítulo 17: Um desastre que desfalece as esperanças
Capítulo 18: “O vaqueiro dos Becchi” retorna para a escola
Capítulo 19: Mais dificuldades na escola de Castelnuovo
Capítulo 20: Um amigo para toda a vida
Capítulo 21: “Se eu for sacerdote, serei muito diferente”
Capítulo 22: Férias em Sussambrino
Capítulo 23: O sacrifício de pedir ajuda
Capítulo 24: Chieri, uma cidade repleta de história, piedade e estudos
Capítulo 25: O início dos estudos em Chieri
Capítulo 26: Uma memória extraordinária
Capítulo 27: O cuidado de João em escolher suas amizades
Capítulo 28: A Sociedade da Alegria: uma maneira de evangelizar os colegas
Capítulo 29: O cultivo da espiritualidade na Sociedade da Alegria
Capítulo 30: João Bosco, filho de Maria Santíssima e testemunho da santidade para os seus colegas
Capítulo 31: O ano escolar de 1832-1833: a crisma de João Bosco e a ordenação do Pe. Cafasso
Capítulo 32: O amigo Luís Comollo
Capítulo 33: Um trabalho exigente no Café Pianta
Capítulo 34: Uma presença que causava admiração e fazia a diferença
Capítulo 35: A amizade e a conversão do judeu Jonas
Capítulo 36: Um jovem com muitos talentos e habilidades
Capítulo 37: Crise vocacional de João Bosco e a decisão de fazer-se franciscano
Capítulo 38: “Deus te prepara outro lugar, outra messe”
Capítulo 39: O Pe. Cinzano, instrumento da providência divina no caminho vocacional de João Bosco
Capítulo 40: O dia em que João Bosco recebeu a batina
Capítulo 41: E finalmente João entra no seminário