No mês de agosto vivemos como Igreja o mês vocacional. É também o mês em que, como Família Salesiana, celebramos o nascimento de Dom Bosco! Os biógrafos de Dom Bosco, a mãos cheias, nos relatam o quanto Dom Bosco trabalhou pelas vocações. Foi orientador espiritual de inúmeros jovens, acompanhando-os em seu processo de amadurecimento humano e cristão. Motivou a muitos para que entrassem nos seminários e se tornassem sacerdotes. Mesmo entre seus jovens oratorianos, com encantadora sensibilidade, percebeu que alguns carregavam claros indícios para a vocação religiosa e sacerdotal. Entendia que os jovens, o quanto antes, devem se abrir para acolher generosa, decidida e corajosamente o chamado de Deus… Sem perder tempo, pois quem “demora a se doar nessa vida, corre grande perigo”.
Foi a partir dessa consciência que, numa certa ocasião, ele propôs a alguns jovens do Oratório de Valdocco que iniciassem, acompanhados por ele, um “tempo de prova” a serviço de Deus com a prática de exercícios de caridade e testemunhando constante alegria. Estava plantada, assim, em bom terreno, a semente da futura Congregação Salesiana. Insistia Dom Bosco que o egoísmo, o individualismo e a vaidade não conduzem à plenitude da alegria, pois “Deus nos colocou no mundo para os outros”, para o serviço, a missão, a solidariedade.
1. O caminho vocacional, um dia abraçado, traz exigências!
Dom Bosco, no entanto, nunca permitiu que os jovens por ele acompanhados fizessem um caminho sem a necessária clareza do que isso implicava; em outras palavras, Dom Bosco não enganou a ninguém. Vida religiosa e vida sacerdotal não se caracterizavam, para Dom Bosco, como busca de poder, dinheiro, bem estar, seguranças, privilégios ou coisas parecidas. A voz de sua mãe, no dia de sua ordenação sacerdotal, alertando-o para que não se permitisse tornar um padre rico, o acompanhou ao longo de toda a sua vida. Não é irrelevante considerar que um dos grandes elogios feitos a Dom Bosco vai justamente nesta linha: “Dom Bosco é padre, sempre padre, em todos os lugares, na casa do pobre ou na casa do rico, dentro dos palácios no escritório do ministro ou no altar celebrando a Eucaristia”. Viveu pobre, despojado e assim morreu!
Procurava deixar claro aos seus jovens que a vocação é dom de Deus, como afirmado por Cristo Jesus: “Não fostes vós que me escolhestes, mas eu vos escolhi e vos constituí para que produzais frutos” (Jo 15,16). Neste sentido é fundamental pensar que, embora toda nossa vocação possa se manifestar também através de tantas mediações humanas, o que não pode ser desconsiderado é isso: a iniciativa de escolher, chamar e consagrar é sempre de Deus. E Ele concede, aos que escolhe e consagra, toda sorte de bênçãos espirituais para que vivam o dom vocacional recebido, na medida em que se fazem abertos à ação da graça divina!
Por isso, uma vez chamados e consagrados, como perseverar, e mais ainda, como viver na fidelidade, sem recorrer constantemente à ação da graça de Deus? Afinal, “nossa fidelidade se apoia na fidelidade de Deus”! Sem um amor imenso à Eucaristia, memorial do supremo gesto redentor do Filho no cumprimento da vontade do Pai, sem o restaurador exercício da leitura orante da Palavra de Deus, alimento que nos fortalece e nos renova no serviço como pastores-educadores dos jovens, sem o cuidado na vivência do sacramento da reconciliação, sem a prática da reflexão, sobretudo da meditação, silêncio que se faz prece? Eventuais justificativas (mesmo de caráter pastoral ou pedagógico) não funcionam. Mais cedo ou mais tarde nossa ação será marcada pelo ativismo estéril, virá o esvaziamento espiritual… E, infelizmente, o desânimo vocacional! O Espírito de Deus é quem nos faz sempre vigilantes e nos indica o caminho da fidelidade, pois somente uma vida de esforço, coerência, busca pelo perdão e pela misericórdia de Deus, farão com que as promessas feitas quando abraçamos uma vocação, se tornem, ao final da vida, “fidelidade comprovada”.
E sem ingenuidades! Embora sejamos partícipes de uma espiritualidade que se caracteriza, como queria Dom Bosco, pela alegria, o sentido da cruz continua sendo importante para a vida de todo vocacionado/consagrado! Sendo sinal de contradição, realidade que traspassou de dor o coração de Maria, a cruz sempre nos oportuniza o crescimento na fé. Na aparente morte definitiva de Jesus Crucificado, na verdade estava a plenitude da vida! Aquilo que parecia ser a maior da frustrações e a mais vergonhosa das derrotas, na realidade foi a vitória inquestionável do Filho unigênito que desce à mansão dos mortos, mas não se torna refém da morte: ressuscita! Assim, cair e pecar faz parte da existência humana! A fé na ressurreição e a certeza da misericórdia divina, porém, nos envolvem, nos colocam de pé, nos renovam e, assim, nos sentimos como Paulo Apóstolo: “Quando sou fraco, aí que sou forte!”. Que consoladora esta experiência para todos os que são chamados e consagrados por Deus.
2. Para os tempos em que estamos!
Aprendemos assim, de Dom Bosco, que não nos cabe uma imatura postura de quem passa os seus dias reclamando do tempo em que vive! Fôssemos elencar as dificuldades e sofrimentos vividos por Dom Bosco teríamos uma bela e longa lista. Como ele, porém, enxergamos até mesmo nas dificuldades, desafios e contradições socioculturais o chamado de Deus que não nos chamou e consagrou para “coisas fáceis”! Ainda que exigente se manifestem os contextos onde estamos inseridos, com profundas marcas de relativismo e secularismo, os vocacionados/consagrados são chamados a ser um sinal vivo de esperança! E por que? Porque anunciam a grande, a maior das verdades, aquela que expressa toda a riqueza de suas vidas: a fé no Cristo Ressuscitado! Assim, definitivamente, se Deus é por nós, quem será contra nós? Recordemos que para aqueles que são vocacionados a vida religiosa e/ou sacerdotal não há ciência mais eminente do que conhecer Jesus Cristo… E não há maior alegria do que revelar ao mundo as insondáveis riquezas do seu mistério de amor!
Como pessoas consagradas e membros de uma família cujo pai espiritual é Dom Bosco não podemos permanecer alheios ao empenhativo chamado em busca de uma renovada fidelidade ao carisma, ao espírito, à pedagogia salesiana! Não podemos nos esquecer que somos filhos espirituais de um pai ousado, corajoso, criativo, empreendedor, cheio de fé! Dizia ele: “em tudo aquilo que for para o bem dos jovens, eu quero estar na vanguarda”… E ainda: “Não dei passo, não pus mão a empreendimento algum na vida que não visasse tão somente a salvação, o bem dos jovens”! Pecar pela omissão, pelo medo, pelo distanciamento dos jovens, pela timidez, pelo individualismo, pelo pessimismo, pelo desencanto e desesperança, só porque os tempos são difíceis, seria trair Dom Bosco!
Renovando o grande ideal salesiano: “em todo jovem, mesmo no mais difícil, é possível encontrar algum sinal ou alguma semente de bem” e que, se descoberta, permitirá a este jovem estabelecer percursos de crescimento, façamos dos jovens a grande ‘missão de nossas vidas! Se Deus nunca desiste de nós, sejamos verdadeiramente sinais do amor de Deus para os jovens… e não desistamos deles!
3. Na escola de Dom Bosco, a partir de três referências muito concretas!
A bondade/mansidão de São Francisco de Sales: viver e propor aos jovens o Evangelho da Alegria mediante a pedagogia da bondade! A imagem da abelha, que colhe o néctar, a seiva, sem causar prejuízo à flor, é sempre oportuna para nós que queremos caminhar com os irmãos, testemunhando a profecia da vida fraterna e com os jovens. Nem à frente, nem atrás, mas ao lado deles, para fazê-los sabedores do essencial: encontrar-se com a pessoa de Jesus Cristo.
Os primeiros missionários salesianos: entre os conselhos oferecidos a eles por Dom Bosco, constavam “manter viva a devoção a Nossa Senhora Auxiliadora, não permitir que se apague o ardor, evitando pactuar com a mediocridade e a superficialidade nas relações humanas e mantendo um estilo de vida simples, superando qualquer tentação de aburguesamento e se distanciando de toda forma de ostentação e luxo!
E a presença de Nossa Senhora Auxiliadora: nenhum vocacionado e nenhum consagrado salesiano persevera em sua vocação sem um amor profundo à Virgem Auxiliadora. Quando não sabemos o que fazer e pra onde ir, ela é mestra e ensina: “eu vos darei a mestra”! Quando estamos tristes e cansados, ela é mãe silenciosa que acolhe, afaga e oferece o esperado colo de mãe! Quando estamos desanimados, ela, como em Caná, nos mostra Jesus… E ele, que não sabe negar nada à Mãe, diz: “Vinde a mim, vós que estais afatigados, cansados, e eu vos darei paz, alivio”! Quando estamos imersos em tentações, sofrimentos, quase para cair, ela é a Virgem do Apocalipse! Coloca-se ao nosso lado e mata/manda para longe os dragões que querem nos devorar! Quando as tormentas assolam a nossa existência e a cruz é muito pesada, mostrando-se superior às nossas forças, ela, como fez com Jesus, está ao pé da cruz nos consolando e curando nossas feridas! E mesmo neste momento, se ainda perdura entre nós alguma dúvida sobre a presença materna e operosa de Maria na vida da Igreja e na vida de cada um de nós, assim como Dom Bosco, acolhamos a materna orientação por Ele oferecida ao ainda pequeno Joãozinho Bosco: a “seu tempo tudo compreenderás”!
Retornemos a Dom Bosco para encontrar em sua vida e espírito uma forma bela e instigante de seguir a Jesus Cristo. E Jesus Cristo, Rosto do Amor Misericordioso do Pai, nos espera nos milhares de adolescentes e jovens que encontramos pela vida!
Pe. Edson Donizetti Castilho, SDB